Porque Podcasting não é rádiodifusão!


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Recentemente, neste mesmo espaço, andei tecendo alguns comentários - superficiais, é verdade - sobre as diferenças entre o podcasting e a radiodifusão, principalmente no que tange ao formato intrínseco de cada mídia. Naquele momento não me atentei sobre - nem me aprofundei no - quesito, "o rádio e um conjunto de podcasts".

Avaliando, agora, a relação entre um conjunto de podcasts e uma rádio, tal qual a conhecemos, eu devo - respeitosamente - manter minha opinião inicial: Podcasting não possui nada a ver com radiodifusão.

Meu rádio não sintoniza, automaticamente, conteúdos apenas para mim. Mais ainda! Os programas de uma rádio são
estruturados por sei lá quem... só sei que não é por mim! Se estou ouvindo uma rádio e me dá vontade de ouvir um programinha sobre música de câmara e na seqüência uma seleção das notícias sobre economia nacional, seguido por um análise bem-humorada sobre Fórmula 1 entremeada por música latina e p'ra encerrar, ouvir poesias declamadas em bom e castiço português lusitano, eu provavelmente não irei conseguir atingir meu intento. O podcasting, no entanto, me oferece uma sintonia infinita; a assinatura de podcasts me transformam em uma "estação" única, a qual pode ser personalizada de acordo com minhas necessidades e, assim, saciar meu egoísta, único e supremo prazer.

Com uma estação de rádio?! Bem... 'tô frito: sou obrigado a ouvir o que eles me dão, no mesmo instante em que eles transmitem. Com o podcasting eu escuto o que desejo, onde e como quero, selecionando as locuções e gerenciando a seqüência de conteúdos.

Eu não posso retroceder ou avançar um programa de rádio se eu desejo ouvir um trecho novamente ou se estou insatisfeito com o que está sendo transmitido; e se eu sair rodando a sintonia do radinho aleatoriamente, é bem provável que eu nunca encontre o que procuro. Cada arquivo mp3 em meu playerzinho está lá porque eu o coloquei alí! Eu possuo total controle sobre todos os aspectos desta experiência: eu posso afinar, refinar, ajustar - enfim - os padrões de áudio, o ritmo e o conteúdo. Isto cria um enorme diferencial subjetivo em minha atitude como ouvinte. Eu estou ordenando o conteúdo, ele não está sendo imposto a mim.

Podcasting não é radiodifusão, assim como um DVD de um show ao vivo não é uma transmissão de TV ao vivo do mesmo evento. A experiência de um vídeo digital no seu computador está a parsecs de distância daquela vivenciada em um cinema. Momento, local e meio de reprodução são elementos cruciais. O "o quê", "onde", "quando" e "como" referentes à mídia e seu consumo são, por fim, tão influentes na determinação do tipo e qualidade da experiência, assim como o conteúdo informativo da mídia em si. Um daqueles blockbusters hollywoodianos atuais não impressionam nadica de nada quando os reproduzidos eu um iPod, dentro de uma composição completamente lotada do Metrô de SP. Agora vá para uma bela sala de cinema com surround-sound e assista ao mesmo filme...

Rádio e podcast podem se aproximar ou complementar-se, eles podem até reposicionar seus conteúdos de uma forma para uso em outra, mas a experiência de utilização - alguns mais afoitos na evolução da língua irão preferir a aplicação do neologismo usabilidade - será complemente diferente para cada uma das mídias. A radiodifusão - pelo seu caráter expansivo e massivo - age de modo bem diferente no tipo e qualidade da interação e da atenção de uma audiência quando comparado com um podcast .

O podcasting pode até mesmo se tornar em uma mídia que substitua o rádio - já observa-se alguns pequenos indícios da ocorrência deste fenômeno na Europa e nos EUA. Caso se confirme esta tendência de mudança dos padrões de consumo em tempo real e de atenção, teremos conexões web de sistemas on-demand filtrados substituindo antenas e aparelhos de rádios.

Do massivo para o nicho, do coletivo para o indivíduo. Estas são importantes diferenças, as quais deverão - certamente - afetar o ambiente sócio-cultural humano dos próximos anos.

É incontestável que a rádio possui um imenso valor cultural para a humanidade e que possui fatores e modelos extremamente difíceis de serem reproduzidos em podcasts. Um exemplo imbatível é a repercussão de fatos em tempo real. E novamente, afirmo: rádio não é podcast e vice-versa.

Os dois podem compartilhar certos elementos do mesmo DNA de áudio-efeito, eles podem se mixar, complementar-se é até impulsionar um ao outro, mas eu creio que o desenvolvimento do podcasting e o impulso que a compartimentalização de conteúdo e as necessidades de nichos específicos serão fatores preponderantes para definir modelos de produção distintos e economicamente viáveis.


Sérgio Vieira - autor deste artigo, além de - em priscas eras - haver experimentado a função de radialista, hoje é podcaster e se diverte em explicar as diferenças entre abelhinhas e florezinhas.
http://impressoes.vocepod.com
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